Na guarda compartilhada, o que se pretende é que ambos os genitores conjuntamente exerçam o poder familiar sobre suas crianças, ainda que não vivendo sob o mesmo teto. A finalidade é evitar a restrição ao direito à convivência familiar, não só com o genitor, mas com o grupo familiar mais amplo integrado pelo menor.
Assim, é um modelo não adequado a todas as situações, pois pressupõe como requisito para funcionar um mínimo de convivência pacífica entre os pais. A base da guarda compartilhada é que o menor tenha o referencial de casa, de residência, mas tenha a livre visitação do genitor não morador da residência, bem como sua participação ativa na vida cotidiana da criança e do adolescente.
Para tanto, embora não seja essencial o consenso entre os pais, podendo a guarda compartilhada ser determinada por meio de decisão judicial no melhor interesse da criança, por sua flexibilidade intrínseca, a falta de consenso e a existência de conflitos entre os pais podem inserir o filho em uma situação de conflito constante, que tanto lhe se será lesiva quanto uma regulamentação inflexível de sua permanência com o genitor não contemplado com a guarda. Daí porque, embora não dependa do consenso, podendo ser imposta por decisão judicial no âmbito do direito de família, para o maior êxito da guarda, é recomendável que haja consenso e boa vontade dos pais em fazê-la operar.
O modelo de guarda compartilhada diferencia-se ainda do conceito de guarda alternada, onde nesta o filho permanece um certo tempo preestabelecido com o pai e com a mãe, como, por exemplo, quinze dias alternados com cada um, o que pelo bem do menor em nada é recomendado, pela perda do referencial de casa. Esta guarda melhor atende aos interesses dos genitores, mas não aos da criança, que perde referenciais e rotinas.
Os artigos 1.583 e 1.584 do Código Civil foram alterados pela lei 11.698/2008 em e posteriormente, pela lei 13.058/2014, chamada então a lei da guarda compartilhada. Estes artigos disciplinam como funciona a guarda dos filhos na forma compartilhada.
Art. 1.583. A guarda será unilateral ou compartilhada.
§ 1o Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5o) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns.
§ 2o Na guarda compartilhada, o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos.
I – (revogado);
II – (revogado);
III – (revogado).
§ 3º Na guarda compartilhada, a cidade considerada base de moradia dos filhos será aquela que melhor atender aos interesses dos filhos.
§ 4o (VETADO).
§ 5º A guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar os interesses dos filhos, e, para possibilitar tal supervisão, qualquer dos genitores sempre será parte legítima para solicitar informações e/ou prestação de contas, objetivas ou subjetivas, em assuntos ou situações que direta ou indiretamente afetem a saúde física e psicológica e a educação de seus filhos.
Art. 1.584. A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser:
I – requerida, por consenso, pelo pai e pela mãe, ou por qualquer deles, em ação autônoma de separação, de divórcio, de dissolução de união estável ou em medida cautelar;
II – decretada pelo juiz, em atenção a necessidades específicas do filho, ou em razão da distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe.
§ 1o Na audiência de conciliação, o juiz informará ao pai e à mãe o significado da guarda compartilhada, a sua importância, a similitude de deveres e direitos atribuídos aos genitores e as sanções pelo descumprimento de suas cláusulas.
§ 2o Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor.
§ 3o Para estabelecer as atribuições do pai e da mãe e os períodos de convivência sob guarda compartilhada, o juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, poderá basear-se em orientação técnico-profissional ou de equipe interdisciplinar, que deverá visar à divisão equilibrada do tempo com o pai e com a mãe.
§ 4o A alteração não autorizada ou o descumprimento imotivado de cláusula de guarda unilateral ou compartilhada poderá implicar a redução de prerrogativas atribuídas ao seu detentor.
§ 5o Se o juiz verificar que o filho não deve permanecer sob a guarda do pai ou da mãe, deferirá a guarda a pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida, considerados, de preferência, o grau de parentesco e as relações de afinidade e afetividade.
§ 6o Qualquer estabelecimento público ou privado é obrigado a prestar informações a qualquer dos genitores sobre os filhos destes, sob pena de multa de R$ 200,00 (duzentos reais) a R$ 500,00 (quinhentos reais) por dia pelo não atendimento da solicitação.
Nas lúcidas palavras da Ilustre Ministra do STJ, Nancy Andrighi, a jurisprudência:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. GUARDA COMPARTILHADA. CONSENSO. NECESSIDADE. ALTERNÂNCIA DE RESIDÊNCIA DO MENOR. POSSIBILIDADE.
1. A guarda compartilhada busca a plena proteção do melhor interesse dos filhos, pois reflete, com muito mais acuidade, a realidade da organização social atual que caminha para o fim das rígidas divisões de papéis sociais definidas pelo gênero dos pais.
2. A guarda compartilhada é o ideal a ser buscado no exercício do Poder Familiar entre pais separados, mesmo que demandem deles reestruturações, concessões e adequações diversas, para que seus filhos possam usufruir, durante sua formação, do ideal psicológico de duplo referencial.
3. Apesar de a separação ou do divórcio usualmente coincidirem com o ápice do distanciamento do antigo casal e com a maior evidenciação das diferenças existentes, o melhor interesse do menor, ainda assim, dita a aplicação da guarda compartilhada como regra, mesmo na hipótese de ausência de consenso.
4. A inviabilidade da guarda compartilhada, por ausência de consenso, faria prevalecer o exercício de uma potestade inexistente por um dos pais. E diz-se inexistente, porque contrária ao escopo do Poder Familiar que existe para a proteção da prole.
5. A imposição judicial das atribuições de cada um dos pais, e o período de convivência da criança sob guarda compartilhada, quando não houver consenso, é medida extrema, porém necessária à implementação dessa nova visão, para que não se faça do texto legal, letra morta.
6. A guarda compartilhada deve ser tida como regra, e a custódia física conjunta – sempre que possível – como sua efetiva expressão.
7. Recurso especial provido.
(REsp 1428596/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/06/2014, DJe 25/06/2014)
A respeito da guarda compartilhada, vem entendendo o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro:
0223494-58.2007.8.19.0001 – APELAÇÃO – DES. CHERUBIN HELCIAS SCHWARTZ – Julgamento: 05/02/2013 – DÉCIMA SEGUNDA CÂMARA CÍVEL – APELAÇÃO CÍVEL. CAUTELAR DE GUARDA COMPARTILHADA. VISITAÇÃO QUE SE ENCONTRA ABARCADA PELO PEDIDO DE GUARDA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA PARCIAL. Autor e ré apelaram a fim de detalhar com mais rigor a visitação. Medida desnecessária. Bom senso e razoabilidade que se esperam de pais em relação a seus filhos, visando sempre o melhor interesse do menor. Recursos aos quais se nega provimento.
0008737-35.2010.8.19.0002 – APELAÇÃO – DES. MILTON FERNANDES DE SOUZA – Julgamento: 14/12/2012 – QUINTA CÂMARA CÍVEL – FILHO MENOR. GUARDA COMPARTILHADA. 1- A concessão da guarda compartilhada pressupõe a existência de relação harmoniosa entre os genitores, pois tudo relacionado à vida da criança será decidido por ambos e em conjunto. 2- Assim, inexistindo esse consenso, incabível à adoção dessa modalidade de guarda.
0013868-83.2009.8.19.0209 – APELAÇÃO – DES. GILBERTO DUTRA MOREIRA – Julgamento: 12/12/2012 – DÉCIMA CÂMARA CÍVEL – GUARDA COMPARTILHADA COM A GENITORA AÇÃO PROPOSTA POR GENITOR – ESTUDO SOCIAL E PSICOLÓGICO CONDUTA SOCIAL DESFAVORÁVEL – INDEFERIMENTO DA PRETENSÃO INTERESSE DE(O) MENOR. Apelação Cível. Guarda e visitação de menor. Pai, militar-aposentado, que, alegando possuir tempo livre, pleiteia a guarda compartilhada de filho menor que, à época da propositura da ação contava com apenas 11 meses e, hoje, está com pouco mais de 4 anos. Prova dos autos que indica uma solicitude exagerada do pai com relação à saúde e cuidados com a criança. Estudo psicológico que, inclusive, aconselha tratamento psiquiátrico ao ora apelante. Autor que reagiu de forma surpreendente, considerando os estudos técnicos como ofensas pessoais, propondo ação indenizatória em face das duas profissionais que apresentaram laudos nestes autos. Guarda compartilhada que não se caracteriza por uma divisão matemática das horas semanais entre duas residências, mas por uma cooperação dos pais nos cuidados dos filhos. Mãe do menor que não se opõe à participação do pai nas atividades cotidianas do filho que, inclusive, já vinha ocorrendo. Movimentação constante entre duas residências, durante o período escolar que pode gerar instabilidade e insegurança ao menor, especialmente quando os pais não se entendem, como é o caso destes autos, em que as partes expuseram, sem qualquer motivo prático, correspondências íntimas demonstrando que os desacordos vinham desde a época em que conviviam. Unanimidade entre representantes do Ministério Público e profissionais que elaboraram os estudos social e psicológico neste sentido. Situação que, entretanto, pode ser revista no futuro, em que a criança se encontre mais madura bem como melhor acomodada a relação entre o ex-casal. Desprovimento do recurso.
0002796-44.2011.8.19.0043 – APELAÇÃO – DES. PATRÍCIA SERRA VIEIRA – Julgamento: 31/10/2012 – DÉCIMA CÂMARA CÍVEL – APELAÇÃO CÍVEL. Ação de guarda e regulamentação de visitas ajuizada pelo apelado, pleiteando a guarda de seu filho de 2 (dois) anos de idade em face da mãe do menor, ora apelante. Sentença de procedência do pedido, deferindo a guarda ao apelado e regulamentando a visitação da apelante. Apelo da genitora pretendendo obter a guarda do menor e, subsidiariamente, requerendo seja determinada a guarda compartilhada ou alternada, ou, ainda, seja permitida a permanência do seu filho em sua companhia durante a integralidade das férias. Partes que residem em cidades muito distantes: o genitor em Piraí e a apelante em Foz do Iguaçu. Correto o magistrado de primeiro grau ao deferir a guarda ao pai, tendo em vista que o menor está inserido na estrutura familiar paterna desde o seu nascimento. Necessidade de atender-se ao melhor interesse da criança. Impossibilidade de implementação de guarda compartilhada ou alternada enquanto as partes residirem em cidades tão distantes. Reforma da sentença apenas para ampliar os períodos de visitação materna durante as férias e feriados prolongados. RECURSO A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO.
0007803-63.2009.8.19.0212 – APELAÇÃO – DES. CUSTODIO TOSTES – Julgamento: 29/10/2012 – PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL – DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO DE GUARDA E RESPONSABILIDADE E RECONVENÇÃO DE GUARDA COMPARTILHADA C/C REGULAMENTAÇÃO DE VISITA. Estudo social apontando forte vínculo afetivo entre pais e filha, mas turbulento o relacionamento entre pais, o que depõe contra o deferimento da guarda compartilhada. Reforma do julgado para manutenção da guarda conferida à genitora e regularização da visitação nos moldes sugeridos, em parte, pela mãe e pelo mp. Autora vencida em parte mínima do pedido em relação à ação de guarda, sendo recíproca a sucumbência no tocante à reconvenção. Provimento parcial de ambos os recursos.