[Tenho uma casa herdada e mais quatro irmãos. Tenho a intenção de ficar com a casa comprando a parte dos outros. Estou morando na casa. Comecei comprando uma parte de uma irmã ficando ainda um valor para paga-la. Acontece que o outro irmão resolveu entrar na história e disse que eu teria 30 dias para pagar esse valor faltante ou ele iria comprar e dizendo que o valor que eu já paguei, ele iria me pagar em prestações. Como fica essa situação? Se ele comprar, ficamos cada um com uma parte dessa irmã? Sou obrigado a vender para ele a parte que paguei? ( B.- Sorocaba /SP)]

Alguns aspectos do fato, que serão relevantes no caso de, futuramente, haver conflito sobre a destinação a ser dada ao bem, não constam da pergunta. Por exemplo, não ficou claro se já houve partilha, estando o imóvel em condomínio entre os irmãos, com a devida averbação no Registro de Imóveis, ou se permanece tal como recebido pela herança, ainda não regularizado o registro. Igualmente, não restou esclarecido se foi firmado documento escrito correspondente à compra e venda (ou cessão de direitos hereditários, caso ainda não partilhado). A existência de documento escrito, prevendo claras regras para o negócio jurídico realizado, facilita que se conheça a vontade real das partes contratantes, de modo a que seja preservada.

Convém lembrar, antes, que para a transferência de propriedade de bem imóvel a lei exige (art. 1245, Código Civil) o registro do título translativo no Registro de Imóveis, devendo ainda ser celebrado o contrato por escritura pública, cf. dispõe o art. 108, Código Civil, salvo se o valor for inferior a 30 vezes o maior salário mínimo vigente no país.

Também para a cessão de direitos hereditários exige-se escritura pública (lavrada em cartório), na forma do art. 1793, do mesmo código.

Não sendo atendida a forma legal importa por lei, há nulidade do contrato, cf. art. 166 do Código Civil, e poderá qualquer interessado alegá-la, pedindo sua declaração judicial.

Mas em ambos os casos, alguns aspectos não se alteram: ninguém é obrigado a vender o que quer que seja, a ninguém. E seu irmão não pode exigir o desfazimento da venda entre você e sua irmã, nem que você venda para ele a sua parte ou a parte que adquiriu de sua irmã. Seu irmão poderá, sim, pleitear judicialmente a declaração de nulidade do negócio se a cessão não foi feita por escritura pública, mas não da forma como ele pretende.

Qual o prazo fixado para a integralização do pagamento? Se este prazo foi ultrapassado, o comprador está em mora, e a vendedora (e somente ela) pode exigir o cumprimento integral do contrato ou o seu desfazimento.

Se não foi fixado prazo ou o prazo acordado não se extinguiu, então nem mesmo a vendedora poderá exigir o pagamento em prazo distinto do acordado. Com mais razão, não poderá terceiro (no caso, o irmão que não participou do contrato) fazê-lo.

Se há contrato escrito, com previsão de cláusula resolutória (quando o contrato é extinto pelo inadimplemento) expressa, pode a vendedora tê-lo por resolvido (ou seja, cancelado), pelo simples fato de não haver a integralização do preço, e vendê-lo a terceiro (ou seja, pode repassar a sua parte no imóvel para o outro irmão). Se, contudo, não há essa previsão, a resolução depende de interpelação judicial do devedor (art. 474, Código Civil).

Se não há contrato escrito, e estas cláusulas não foram esclarecidas quando do negócio jurídico, então, para sua rescisão será necessária a interpelação judicial. E somente a vendedora tem legitimidade para fazê-la. O terceiro (outro irmão) não pode exigir o cumprimento da obrigação, nem impor qualquer outra medida ao autor.

A vendedora também não pode repartir a sua cota no imóvel e vender a uma parcela a terceiro (irmão ou não), porque já se obrigou à venda para o primeiro irmão. Antes, o primeiro negócio deve ser desfeito.

Se a vendedora vender a outro a parte que já lhe vendeu, você poderá, judicialmente, questionar este segundo negócio e exigir o cumprimento do primeiro contrato, observada a restrição quanto à forma do contrato, se não foi celebrado por escritura pública. Se for este o caso, é recomendável que, na propositura da ação, deposite judicialmente a diferença do preço faltante, com juros legais (1% ao mês) e correção monetária, da data que o pagamento deveria ter sido feito, até a data da propositura da ação.

Lembrando que se trata de uma questão em família, é muito importante a tentativa de resolução do problema por conciliação entre os irmãos. Pois é fato que muitas disputas mal resolvidas por heranças acabam por separar familiares e decerto esse não era o objetivo dos pais ao deixar a herança, ou mesmo dos irmãos que a recebem.

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